O famoso consultor e escritor Peter Drucker, em um dos seus últimos livros, Sociedade Pós-Capitalista, publicado logo após a queda do muro de Berlim, entre inúmeras análises e cenários que descreveu, um deles me chamou bastante atenção – o maior desafio da gestão no século XXI será lidar com pessoas.
Ao que tudo indica, quanto mais conhecimento nós temos como sociedade, qualquer que seja o tipo, com destaque para ciência e tecnologia, maior é a demanda por pessoas ainda mais qualificadas, não apenas nas áreas de expertise nas incontáveis dimensões das atividades e interesses humanos, mas principalmente no que é genuinamente humano. É como se estivéssemos sendo desafiados a sermos ainda mais humanos na essência, individualmente e coletivamente.
Cada vez mais vivemos dilemas éticos no uso do que conhecemos, especialmente com as tecnologias que podem emular diversos elementos da cognição humana e até com perspectivas de ir além, assumindo características antropológicas, vieses do comportamento humano e outros aspectos ainda não vislumbrados.
Quando falamos de gestão de pessoas e seus desafios, impossível não destacar Inteligência Emocional e os crescentes conhecimentos sobre o comportamento humano revelados pelos estudos e pesquisas em Neurociência.
O que é Inteligência Emocional?
Inteligência Emocional é um conjunto específico de aptidões utilizadas no conhecimento e processamento das informações relacionadas à emoção. O termo “Inteligência Emocional” foi criado pelo americano Daniel Goleman na década de 90 e significa a capacidade de sentir, entender, controlar e modificar o estado emocional próprio ou de outra pessoa de forma organizada.
Podemos dizer que possuímos duas mentes, consequentemente, dois tipos diferentes de inteligência: racional e emocional. Nossa performance na vida é determinada não apenas pelo QI (Quociente de Inteligência), mas principalmente pela Inteligência Emocional (QE). Na verdade, o intelecto não pode dar o melhor de si sem a Inteligência Emocional, ambos são parceiros integrais na vida mental. Quando esses parceiros interagem bem, ambos aumentam. Isso derruba o mito de que devemos sobrepor a razão à emoção ou ao contrário, e sim buscar desenvolvimento e equilíbrio em ambas, gerando sinergia.
Daniel Goleman, classifica a Inteligência Emocional em cinco áreas de habilidades:
- Autopercepção – É a capacidade da pessoa conhecer a si própria, em termos de seus comportamentos frente às situações de sua vida social e profissional, além do relacionamento consigo mesmo.
- Autocontrole – A habilidade de gerir as próprias emoções, seu estado de espírito e seu bom humor. É saber lidar com os sentimentos e desenvolver a capacidade de confortar-se, controlar a frustração, a ansiedade, a tristeza ou a irritabilidade.
- Automotivação – A aptidão em motivar a si mesmo e realizar as tarefas e ações necessárias para alcançar seus objetivos, independente das circunstâncias.
- Empatia – A habilidade de comunicação interpessoal de forma espontânea e não verbal, e de harmonizar-se com as pessoas. As pessoas empáticas estão mais sintonizadas com os sutis sinais sociais, com os indicativos de que os outros precisam ou o que querem.
- Aptidão social – que é a capacidade de relacionamento interpessoal. A arte de relacionar-se passa, em grande parte, pela aptidão em lidar com as emoções dos outros. É essa aptidão que reforça a popularidade, a liderança e a eficiência do trabalho em equipe.
A Inteligência Emocional no trabalho é o uso inteligente das emoções, ou seja, fazer intencionalmente com que suas emoções trabalhem a seu favor, usando-as como uma ajuda para ditar seu comportamento e seu raciocínio de maneira a aperfeiçoar seus resultados.
Na prática, o trabalho em equipe, canais de comunicação abertos, cooperação, persuasão, persistência, motivação, liderança, empatia, saber escutar e dizer o que pensa são a base da Inteligência Emocional como competência profissional. O desenvolvimento das aptidões emocionais básicas proporciona estar em sintonia com os sentimentos daqueles com quem nos relacionamos, saber lidar com discordâncias, saber mediar conflitos, ter a habilidade de fluir criativamente quando fazemos nosso trabalho e liderar convencendo as pessoas a trabalhar por um objetivo comum.
Quem possui controle emocional, autoestima elevada e autoconfiança apresenta capacidade para identificar muitas soluções para os problemas enfrentados no cotidiano. É notório, por exemplo, que administrar conflitos é uma das competências que mais exige o uso da habilidade ou capacidade emocional, uma vez que no ato de uma negociação a pessoa demonstra ou não equilíbrio entre razão e emoção. As duas se complementam, pois técnica, experiência e visão são fundamentais, porém tudo isso se torna poderoso quando aliados à Inteligência Emocional.
Baixos níveis de Inteligência Emocional no trabalho acarretam custos como menor produtividade, aumento das perdas de prazo, erros e acidentes, alta rotatividade, dentre outros. Quando emocionalmente desequilibradas as pessoas não se lembram, não têm iniciativa, não se organizam, não acompanham, não aprendem nem tomam decisões com clareza.
O que é Neurociência?
Utilizando a definição de Luiza Machado, a neurociência comportamental estuda o sistema nervoso, seu funcionamento e alterações. Diretamente ligada ao comportamento, quando aplicada nos ambientes de trabalho, essa ciência permite criar rotinas laborais mais saudáveis, fluxos personalizados de acordo com as características de cada profissional, além de estimular o autoconhecimento em toda a empresa.
Pode trazer benefícios significativos para a gestão de pessoas. Isso inclui uma abordagem mais eficaz na tomada de decisões, compreensão aprimorada das emoções dos colaboradores e estratégias mais eficientes de liderança baseadas na neurociência comportamental. Além disso, a neurociência pode contribuir para a promoção de um ambiente de trabalho mais saudável e produtivo ao considerar aspectos cognitivos e emocionais na gestão de equipes.
Para aplicar a neurociência na gestão de pessoas, podemos considerar:
- Compreensão do Cérebro – desenvolver uma compreensão básica sobre como o cérebro funciona. Isso pode ajudar a adaptar práticas de gestão para melhor se alinhar com o processamento cognitivo e emocional dos colaboradores.
- Tomada de Decisão – utilizar insights da neurociência na tomada de decisão. Isso inclui considerar a capacidade cognitiva das pessoas, evitando sobrecarregá-las com informações excessivas.
- Comunicação Eficaz – a neurociência pode orientar a forma como você se comunica. Fatores como clareza, repetição e storytelling podem melhorar a retenção de informações e engajamento dos colaboradores.
- Liderança Baseada na Neurociência – Adotar estilos de liderança que respeitem as necessidades sociais e emocionais do cérebro humano. Líderes que demonstram empatia e constroem relações positivas podem influenciar o bem-estar e o desempenho da equipe.
- Ambiente de Trabalho Saudável – Considerar os efeitos do ambiente de trabalho no cérebro. Elementos como iluminação, design do espaço e pausas regulares podem impactar a produtividade e o bem-estar.
- Desenvolvimento Individualizado – Reconhecer as diferenças individuais na forma como as pessoas aprendem e crescem. Adotar abordagens de desenvolvimento que levem em conta a diversidade cognitiva e emocional da equipe.
- Gestão do Estresse – Implementar estratégias para gerenciar o estresse, pois o excesso de estresse pode prejudicar o desempenho cognitivo. Incentivar práticas como mindfulness e pausas breves para recuperação.
- Feeddback Construtivo – Utilizar feedback de maneira construtiva, considerando como o cérebro humano responde a críticas e elogios. Abordar desafios de maneira positiva, destacando oportunidades de melhoria.
Ao integrar estes princípios é possível criar um ambiente de trabalho mais alinhado com as características naturais do cérebro humano, promovendo uma gestão de pessoas mais eficaz e compassiva.
Concluindo, aprofundar o conhecimento de como realmente somos, nos aspectos individualizados ou coletivos (equipes, organizações e sociedade) é de grande relevância para aperfeiçoamento das habilidades em gestão de pessoas, sintonizando com os aspectos tecnológicos, estruturais, sociológicos e outras dimensões. Nos programas de pós-graduação da FGV que lidam com o desenvolvimento humano na gestão de pessoas, abordamos inteligência emocional e neurociência como base para o genuíno conhecimento da natureza humana e como lidar com pessoas de modo efetivo.